quarta-feira, 13 de agosto de 2008

Pontes para o mundo




Descalço e esgotado após caminhar 32 quilômetros, o jovem etíope desce o penhasco em direção ao Nilo Azul...
Ao chegar à ponte Sebara Dildiy, que liga o desfiladeiro cortado pelas águas do Nilo Azul, ele deposita cuidadosamente a pesada cesta com bananas que está levando para vender no mercado. A ponte foi construída há cerca de 400 anos com areia, pedra, visco e cascas de ovos. No idioma Amharic, sebara dildiy significa “ponte quebrada”, alcunha que ganhou em 1935 quando militantes da resistência etíope, armados somente com suas ferramentas de trabalho na lavoura, desgastaram a ponte no espaço entre os arcos centrais para interromper o avanço da força militar italiana. Toda a envergadura despencou, matando os homens.
Na região do norte da Etiópia, próxima à fronteira com o Sudão, esta ponte é a rota mais rápida para o mercado central e atendimento médico. A outra travessia mais próxima sobre as águas do Nilo Azul acrescenta 160 quilômetros a um já exaustivo percurso.
A vida nesta região, onde as famílias sobrevivem com menos de US$1 por dia, gira em torno do mercado. Em um dia bom, é possível ganhar dinheiro o bastante para possibilitar a ida de um filho à escola. No entanto, a maioria das crianças fica em casa pastorando os animais e espantando macacos de suas hortas. As casas de barro têm chão de terra batida. As crianças maltrapilhas são incomodadas por moscas que insistem em voar próximo a suas bocas e olhos.
Somente uma pessoa pode atravessar a ponte a cada vez, tornando as esperas longas e comuns. Quatro homens de cada lado estendem uma corda na extensão da abertura. Depois de 20 minutos o vendedor de bananas se pendura na corda e é puxado até chegar do outro lado. O cesto com as bananas vem logo depois. Cinqüenta pessoas atravessaram a ponte nesse dia, que não registrou nenhum acidente, pelo menos não hoje. Quem despenca da corda encontra a morte certa.
Do outro lado do desfiladeiro, o vendedor pega suas bananas e começa a última etapa de 40 quilômetros para chegar ao mercado.
Foto inspiradora
Em 2001 Ken Frantz, do Rotary Club de Newport News, nos EUA, estava folheando uma edição da revista Geográfica Nacional quando viu a foto de um homem arriscando sua vida para atravessar o desfiladeiro onde fica a ponte Sebara Dildiy. “Na hora soube que deveria consertar aquela ponte. Como rotariano tenho o ímpeto de ajudar os carentes e de combater a pobreza.”
Em março daquele mesmo ano Frantz fundou a entidade sem fins lucrativos Bridges to Prosperity (Pontes para a Prosperidade) e visitou a Etiópia. Em 2002, com recursos próprios e com o apoio de vários Rotary Clubs da Virginia, conseguiu fechar o espaço aberto da velha ponte. Para isso foram necessários transportar até o local nas costas de 350 asnos cerca de 11 toneladas de cimento, aço e equipamentos.
Como Frantz havia imaginado, não tardou para a ponte se tornar essencial à economia local. Pessoas que antes se recusavam a arriscar a vida para atravessar o desfiladeiro penduradas em uma corda, podem agora ir mais vezes ao mercado. Meninas conseguem ir à escola e mulheres são capazes de ganhar seu próprio sustento. Os homens passaram a ir com mais freqüência às cidades em busca de trabalho para suplementar o pouco que ganham na roça. Parentes que não se viam há anos passaram a se visitar.
Depois daquele primeiro reparo da ponte, Frantz conseguiu equiparar as doações de 31 Rotary Clubs com um Subsídio Equivalente da Fundação Rotária para construir 40 pontes em 11 países até o final de 2007. Este ano ele está liderando programas na Bolívia, El Salvador, Peru e Zâmbia. Assim como na Etiópia, as pontes melhoram vidas e evitam mortes. A meta de Frantz é construir anualmente 500 pontes de pedestres, até o ano 2020.
Infelizmente em 2005, a ponte que inspirou o trabalho missionário de Frantz sofreu a ação devastadora de uma grande enchente, que varreu a estrutura de aço usada no reparo. Quando soube disso, Frantz logo se lançou ao trabalho: Ele havia prometido aos camponeses do planalto etíope que teriam uma vida melhor fosse o que fosse, o que poderia implicar a construção de uma ponte totalmente nova. Não havia alternativa para Frantz, pois a entidade que havia fundado havia se tornado a razão de sua vida.
Uma nova vida
Em 2001, quando viu a foto da ponte quebrada, Frantz sentiu que estava por iniciar uma nova fase depois de anos dedicados a uma carreira brilhante. Assim que saiu da faculdade começou a trabalhar no oleoduto do Alasca. Em seguida foi à Califórnia, onde abriu uma empreiteira que construía uma média de 400 apartamentos por ano. Ganhou muito dinheiro mas isso não era suficiente, pois queria ter mais tempo para a esposa e os três filhos. Frantz mudou-se com a família para os campos da Virginia, onde sua esposa cresceu. Voltou ao ramo da construção como empreendedor e conseguiu realizar seu sonho de ter uma pequena ilha, onde construiu uma bela casa. Mesmo assim, questionava seriamente qual era sua missão de vida.
A entidade sem fins lucrativos que fundou tem como objetivo combater a pobreza através da construção de pontes. Voluntários, rotarianos, pessoas da comunidade, engenheiros e estudantes de engenharia dos EUA não apenas constroem as estruturas mas também ensinam a população sobre como podem construir e fazer a manutenção de pontes.
Dado o sucesso nos negócios Frantz, que está com 58 anos e é diretor executivo da Bridges to Prosperity, pode agora se dar ao luxo de ser voluntário em período integral. A entidade que fundou tem funcionários em alguns países. Os Rotary Clubs, junto com engenheiros, empresas, igrejas, doadores privados e outras entidades sem fins lucrativos formaram parceria com a Bridges to Prosperity para fornecer mão-de-obra, verbas e suporte técnico.
Quando Frantz resolveu reconstruir a ponte quebrada na Etiópia buscou primeiro estabelecer parceria com o Rotary. Três clubes da Virginia e um da Etiópia ofereceram doações que vieram a ser equiparadas pela Fundação Rotária, a qual anteriormente já havia fornecido seis Subsídios Equivalentes para ajudar na construção de 23 pontes. As contribuições dos clubes e da Fundação totalizaram US$281.000.
Os rotarianos da Virgínia ajudaram em outros projetos de construção de pontes, mas os sócios do Rotary Club de Bahir Dar, na Etiópia, que se comprometeram a doar US$100, foram marcados não apenas pela ajuda da Bridges to Prosperity como também por terem participado do maior esforço de serviço comunitário de suas vidas. “Os rotarianos conhecem as dificuldades dos moradores da região”, afirmou Abebe Yimenu Tessema, presidente do clube em 2007-08. "O clube de Bahir Dar é o que está mais próximo da ponte, e ainda assim leva três horas de carro e dois dias de caminhada para se chegar lá."
O clube é pequeno e os sócios precisam formar parcerias que causem grande impacto. Com a crise de HIV/aids assolando o país, a falta de escolas na zona rural e o difícil acesso à água potável, os rotarianos de Bahir Dar nunca ficam sem idéias para projetos.
Cumprindo a promessa
Em outubro de 2007 Frantz enviou Mebratu Abebaw, um dos primeiros engenheiros etíopes treinados pelo programa da Bridges to Prosperity, a Sebara Dildiy.
Logo depois que o vendedor de bananas sumiu de vista em direção ao mercado, o jovem engenheiro de Adis-Abeba começou a organizar a coleta de toras de madeira para a construção de uma ponte temporária enquanto a antiga seria reparada. Dias depois chegaram dois homens transportando uma mulher numa maca de couro. Eles haviam caminhado por dezenas de quilômetros, o tempo todo se perguntando como iriam atravessar a ponte quebrada com a mulher doente. Para seu espanto e felicidade a ponte temporária estava pronta para ser usada.
Abebaw diz aos moradores que Frantz voltará em breve, mas que nesse meio tempo eles já podiam abrir uma clareira para chegar mais facilmente à ponte, apanhar pedras e escavar a área que irá servir de alicerce à estrutura da ponte antiga. A espera por uma nova ponte, que há de resistir até mesmo à pior das enchentes, está para findar. A construção de uma ponte nova e permanente terá início no começo do ano que vem.

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