terça-feira, 12 de agosto de 2008

Conversa pessoal com a primeira mulher eleita directora do Rotary


Ao integrar o conselho diretor do Rotary International em julho do próximo ano, Catherine Noyer-Riveau se destacará não somente pelo seu ar parisiense, mas por ser uma verdadeira prima inter pares (primeira entre iguais). A única mulher eleita até hoje para integrar o conselho diretor do RI, ela representará a Zona 11 de 2008 a 2010. Esta médica, terceira geração de rotarianos em sua família, busca consenso e cooperação. Ela reconhece que o novo título lhe confere a responsabilidade de carregar a bandeira da igualdade sexual, mas ela não gosta de publicidade e não se define como feminista. Ao ser entrevistada por Bettina Kozlowski, Noyer-Riveau disse que se vê como uma simples rotariana, determinada a seguir a mesma estratégia que a levou à posição que agora ocupa: definir altos padrões para si mesma, e se possível excedê-los.
Como se sente em ser a primeira diretora eleita do RI?
Não posso dizer que não esteja feliz e orgulhosa, contudo, espero que tenha sido selecionada não por ser mulher, mas devido à minha capacidade. Tudo que desejo é servir ao Rotary da melhor maneira possível.
De que forma vê seu papel como mulher no conselho diretor do Rotary?
Após minha indicação, recebi e-mails de várias rotarianas dizendo: "Vamos desenvolver um projeto das mulheres". Minha resposta é: "Não, vamos desenvolver um projeto dos rotarianos". Não importa se somos mulheres ou homens, sou uma profissional que quer se dedicar a ajudar o próximo. No Rotary, não sou uma "mulher".
Quais serão suas metas como diretora?
Promover os ideais do Rotary, ou seja, o que podemos fazer para ajudar outros seres humanos. Sempre existirá pobreza, mas podemos contribuir para que diminua, não só a pobreza material, mas também a intelectual. Lutar contra o analfabetismo que predomina entre mulheres é uma das minhas prioridades, pois acredito que uma vez que aprendam a ler e escrever, poderão controlar o número de filhos que terão e sua vidas mudarão.
Quais são suas estratégias para alcançar estas metas?
Tenho algumas estratégias e uma visão de onde devemos chegar. Acho que muitos rotarianos se esqueceram da essência de nossa organização. Na Europa, as pessoas vão a uma reunião semanal do Rotary Club com a mesma postura de quem vai jogar baralho. Há também falta de conhecimento do que é a Fundação Rotária, de seus programas e de como estes podem nos ajudar a realizar mais coisas. Ao invés de desenvolvermos pequenos projetos, podemos atuar em escala maior, como o Programa Pólio Plus.
Claro que a ajuda de nossos parceiros foi fundamental, mas em 1985 havia 1.000 casos de pólio por dia, hoje são 2.000 ao ano. Meu irmão teve pólio, portanto este é um assunto que me toca. Precisamos concluir este trabalho, mesmo que a maioria dos rotarianos esteja cansada do assunto. Mais tarde poderemos decidir qual será a próxima iniciativa conjunta, mas agora temos que lutar para erradicar esta doença.
Sente-se desconfortável com a atenção que tem recebido dos demais rotarianos?
Sim, um pouco. Preferiria falar sobre os projetos implementados pela Zona 11, na França, de onde venho, ao invés de sobre o fato de ser a primeira mulher do conselho diretor. Ser mulher é somente um detalhe, minhas habilidades e capacidades são semelhantes às de meus colegas. Tenho orgulho em representar as mulheres, mas não acredito que mereço destaque especial. Não tinha intenção de ocupar este cargo, mas a oportunidade me foi oferecida. Com o tempo sei que vou me acostumar com a idéia de promover os trabalhos das mulheres rotarianas.
Que argumentos apresentou à comissão de indicação de sua zona?
Eu lhes disse que gostaria de promover os valores universais do Rotary, principalmente compreensão mútua e padrões éticos, pois somos todos profissionais que trabalhamos eticamente e usamos nossos conhecimentos para ajudar nossos semelhantes. Também me animei por ter a chance de divulgar o idioma francês. É bom saber inglês, mas devemos manter o orgulho de nosso próprio idioma.
Como convenceu a comissão a selecioná-la?
[Risos] Essa é boa, e não tenho uma resposta para dar. Tenho muitos amigos no Rotary e sou extremamente dedicada à organização. Visitei vários distritos em anos anteriores, e por isso os governadores e os membros da comissão de indicação já me conheciam. Fui três vezes representante do presidente do RI e, como líder de treinamento na assembléia internacional treinei vários dirigentes rotários. Tive a chance de conhecer muitas pessoas que, penso, começaram a comentar sobre mim. Uma mulher rotariana acaba se destacando, mesmo que não seja mais inteligente que os demais.
Isto traz vantagens e desvantagens. Por exemplo, após ser indicada escutei comentários como "Agora tenho que usar saia para ser selecionado". Não é muito prazeroso [risos], mas é assim que acontece, e não tem como evitar isso.
Como o Rotary faz parte de sua vida?
Primeiro, sou reconhecida no clube porque "nasci" nele. Meu avô e pai eram sócios do Rotary Club de Paris. Meu pai por 52 anos. Quanto eu tinha 14 ou 15 anos, ele começou a me levar a eventos rotários. Em 1953, fomos à convenção de Paris. Sempre digo às pessoas "Está vendo, o Rotary começa cedo".
Fale-nos sobre sua carreira no Rotary.
Meu marido é sócio do Rotary Club de L’Isle Adam–Beaumont-sur-Oise. Em 1990-91, o governador de distrito na época, François Duviard-Marsan, comentou: "Vamos começar a trazer mulheres ao quadro social e precisamos de sócias dedicadas a sua profissão". O presidente do clube, meu amigo, respondeu: "Conheço uma que seria ótima". Assim ingressei no Rotary Club de Paris-La Défense-Grande Arche em 1991.
Qual é a situação das mulheres no Rotary Club de Paris, do qual é sócia hoje em dia?
Nosso clube tem 252 sócios, 17 deles mulheres. Preciso dizer mais?
Acredita que o Rotary tem sido mais vagaroso que a sociedade em geral no sentido de convocar mulheres para cargos de liderança?
O chauvinismo não desapareceu e ainda vivemos em um mundo dominado pelos homens. Isso vale para a sociedade e na minha profissão. Lembro ter sido vítima de ciladas de mau gosto na faculdade de medicina, só porque era mulher. Eles queriam me desencorajar a prosseguir. Era parte do jogo, tanto na escola quanto na vida profissional. É por isso que gostaria de promover certos padrões éticos. O problema na França é que a idade média dos rotarianos é muito alta. Contudo, acredito que será diferente em 15 anos, pois as novas gerações estão mais acostumadas a trabalhar lado a lado com mulheres, principalmente mulheres fortes.
O que está dizendo é que as mulheres no Rotary ainda enfrentam machismo? Lembro-me que na convenção do RI em Nice, em 1995, eu usava uma fita branca de presidente eleito de clube. As pessoas me paravam e perguntavam: "Temos mulheres no Rotary agora? E elas podem ser presidente de clube?". Para elas, era uma revolução. Ainda bem que a sociedade está mudando seu comportamento. Meu pai tem 90 anos e foi dono de uma marmoraria que não empregava mulheres. Eu queria estudar arquitetura e sua reação foi: "Espero que não deseje se tornar arquiteta!". Meu pai era contra a entrada de mulheres no Rotary. [Risos] Ele ainda fazia parte do quadro social quando ingressei no Rotary Club de Paris. O bom é que ele não votou contra mim. Um dos meus padrinhos, que me conhecia desde que eu tinha quatro ou cinco anos, também era contra ter mulheres no Rotary. É interessante fazer parte deste grupo agora. Meus pais têm muito orgulho de mim, e participaram da recepção para celebrar minha indicação.
Poderia descrever sua vida profissional e como esta afetou sua vida como rotariana?
Sou ginecologista e tenho meu próprio consultório. Entrei no Rotary para conhecer profissionais de outras áreas. Quando se é médico, não se pode falar de problemas pessoais com os pacientes ou funcionários, para não dar a impressão de fraqueza. As únicas pessoas em quem se pode confiar são outros profissionais. Assim, o Rotary era a solução, e ao conhecer outros rotarianos, percebi imediatamente que compartilhávamos as mesmas preocupações. Este é um dos pontos mais fortes da organização.
Como o clube de seu marido reagiu a esta nomeação?
O clube de meu marido tem 25 sócios. Eles não usam os mesmos padrões de recrutamento, e não querem mulheres no quadro social. Não foi fácil para eles acolherem minha ascensão hierárquica. Atualmente aceitam um pouco melhor. É preciso compreender que a sociedade está mudando. Clubes pequenos, somente com sócios do sexo masculino, se sentem ameaçados ao ver a entrada de mulheres no Rotary. Contudo, suas filhas estão vindo aí.
O que vai fazer depois desta entrevista?
Vou jantar. Meu marido está em casa, esperando a chegada de uma equipe de Intercâmbio de Grupos de Estudos do Gabão. O líder vai se hospedar conosco.
Pensa em se tornar presidente do RI um dia?
De jeito nenhum. Por outro lado, nunca pensei em me tornar diretora. Então, quem sabe?
Bettina Kozlowski, ex-redatora internacional do RI, realizou esta entrevista em francês. A tradução para o inglês foi feita por Alain Drouot, tradutor e interprete sênior do Rotary International.
Gostaria de fazer parte do conselho diretor do RI?
Eis aqui como funciona o sistema. Diretores do RI são selecionados dentre diferentes regiões geográficas, e são responsáveis por definir normas e gerenciar os fundos da organização. O mandato é de dois anos.
Os diretores indicados são selecionados pela comissão de indicação das 34 zonas do RI, em esquema de rotação. Cada distrito elege um representante para servir como membro da comissão, geralmente um rotariano que serviu em vários cargos rotários, inclusive presidente de clube, governador de distrito e membro de comissões internacionais.
Cada diretor indicado é então eleito oficialmente na convenção do RI por delegados votantes selecionados pelos clubes.
Veja mais informações e exceções a estas regras no Manual de Procedimento.

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